Olfato aguçado
pelo aroma do cappuccino. Aprazível. Delicioso. Sensual. Sentia o líquido
ardente rasgar-lhe a garganta. A cafeína emaranhava em seu corpo, quase
unindo-se ao sangue. Parte de si.
Lembranças.
Tortura. Era isso que era. Era isso que sempre seria. Artifício traiçoeiro que
lhe remetia as mais dolorosas recordações. Aquele era o preferido dele.
Chocolate, caramelo, chantilly. Costumava dizer que nada era melhor para
aumentar a libido. Ela ria. Era apaixonada por sua mania de sempre conectar
substâncias quaisquer ao sexo. Pela manhã, recebia-lhe com uma caneca fumegante
da bebida preta, símbolo de seu amor por ela.
Agora tudo era
saudade. Odiava o saudosismo exagerado, mas desde que ele se fora era quase
inevitável. E bebia café. E recordava. E chorava. E dormia. Hábitos malditos
forçavam-na a permanecer no passado. Quando o "nós" ainda os definia.
Chamou o
garçom.
— Mais um copo
de nostalgia, por favor.